domingo, 20 de dezembro de 2009

Boas férias

A termos de conclusão, podemos fazer um esquema que represente, de forma muito suscinta, o conteúdo estudado ao longo de semestre:

  • A perspectiva normativa da língua postula que a língua é uma expressão do pensamento, como é o caso da gramática tradicional, por exemplo (lingüística enquanto domínio, e não enquanto escola);
  • A perspectiva descritiva, por sua vez, postula que a língua é um sistema de signos que estabelecem relação de interdependência entre si, daí a preocupação com a identificação da organização sintática;
  • A perspectiva explicativa, como o próprio nome já diz, procura explicar o funcionamento da língua, com bases na concepção da língua enquanto faculdade, enquanto capacidade inata ao ser humano;
  • A perspectiva interpretativa, que busca o entendimento da língua a partir da análise das condições de produção do discurso - o que caracteriza uma postura materialista -, enxerga a língua como manifestação da ideologia, ou seja, de que lugar social o sujeito fala;
  • A perspectiva funcional, que tem como principal postulado que a organização da língua depende da situação de interação, enxerga a língua enquanto instrumento de comunicação, ou seja, a língua se constitui no uso.
Nicolle Casanova

Funcionalismo

A corrente funcionalista da Lingüística tem como principal postulado a determinação da estrutura da língua pela função que esta exerce nas sociedades em que operam, em condições reais de funcionamento, ou seja, em situação de interação entre falantes. Tem-se, então, que cada função atribuída às expressões lingüísticas tem um modo de significação diferente na oração em que ocorre (sendo “função” entendida como a tarefa atribuída a um elemento lingüístico visando a um objetivo no quadro comunicacional). Considerando estes aspectos do Funcionalismo, fica claro que esta corrente visa ao tratamento da língua em seu caráter eminentemente comunicativo, ou seja, a língua é concebida como um instrumento de comunicação, pois é a situação real, empírica da fala que lhe determina a forma.

Dentre as implicações que decorrem desta abordagem, podemos citar o estudo de estratégias, mecanismos e princípios mobilizados para a realização natural da comunicação, tomando para análise expressões lingüísticas extraídas de contextos específicos. O Funcionalismo, ainda, adere a uma perspectiva bem estruturalista, já que o quadro do uso comunicativo da língua vem definir uma estrutura deste funcionamento, pensamento fruto dos postulados do Círculo de Praga, na metade do século XX. Também podemos citar o privilégio ao método de análise sincrônico, já que somente uma análise de todo o conjunto de fenômenos que ocorrem num momento específico, permitiria o entendimento da relação interdependente que estes fenômenos estabelecem no sistema. Ao mesmo tempo, o Funcionalismo prega que a língua não deve ser concebida como um sistema autônomo, já que não pode ser vista sem medir-se em interação social, cultura, variação, aquisição, evolução.

Assim, o objeto de análise do Funcionalismo constitui-se como a competência comunicativa dos falantes, buscando compreender como a comunicação se dá através desta língua, ou que uso se faz dela para alcançar uma comunicação eficiente.


Nicolle Casanova

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Análise do Discurso de orientação francesa

A partir de 1969, os estudos de Análise do Discurso começam a ganhar força na França através das publicações de Michel Pêcheux, em especial a Análise Automática do Discurso (1969). Pêcheux faz uma leitura althusseriana da teoria lingüística, emprestando importância a elementos dos quais Saussure não se aproximou, a saber, sujeito, história e referente. Propõe uma investigação do processo de materialização da história e do sujeito na linguagem, investigação para a qual não há modelo metodológico. É o próprio objeto e o problema que se cria sobre ele que define quais procedimentos de análise serão mobilizados. A falta de modelo metodológico não significa falta de bases para a teoria, que é bem assentada nos seguintes pressupostos:
· A linguagem não é transparente. Ao contrário do pensamento de Karl Marx, a AD postula que o sentido construído pelo discurso não está na concretude das palavras, mas sim em elementos extralingüísticos, caracterizando então efeitos de sentido que podem ser orientados mas que se encontram à mercê das interpretações individuais
· O inconsciente é determinado pela ideologia, questionando a psicanálise Lacaniana, que postula que o inconsciente é a-histórico
· Não é possível estudar a língua sem considerar a articulação desta com sujeito, história e referente.

Nicolle Casanova

O materialismo histórico e a Análise do Discurso

O materialismo histórico vem explicar o funcionamento da língua através da relação que esta estabelece com aspectos extralingüísticos, isto é, aspectos de ordem social e histórica. Daí o pressuposto central da Análise do Discurso: a investigação sobre o funcionamento da articulação entre língua, sujeito e história. Tem-se que a linguagem é uma materialidade em que o falante se inscreve e, através desta inscrição, constitui-se como sujeito na História.
A perspectiva histórica desta vertente de estudos lingüísticos influenciou na elaboração de conceitos que permitem “mapear” a produção do discurso bem como o processo de construção dos sentidos dentro dele. O conceito de formação discursiva faz alusão ao conjunto de dizeres que podem e devem ser proferidos em determinado tempo histórico, o que significa que a produção discursiva não é independente ou aleatória, uma vez que está associada a condições históricas que lhe determinam. Também podemos citar, a título de exemplo, conceitos como o de interdiscurso, que representa o eixo do já-dito, resgatando outros discursos já produzidos, em outro lugar, independentemente, por uma “voz sem nome”, que são reformulados no eixo do intradiscurso; a memória discursiva, responsável pelo resgate do pré-construído que constitui o interdiscurso, e também os conseqüentes esquecimentos, herança de Michel Foucault, que causam no falante a impressão de ser a origem e a fonte dos dizeres dos quais se apropria.
Estes conceitos vêm ilustrar o objetivo da Análise do Discurso, constituído pela investigação e interpretação do funcionamento discursivo através das determinações impostas pelas condições de sua produção.
Nicolle Casanova

Sintaxe: explorando a estrutura da sentença

NEGRÃO, E. V., SCHER, A., VIOTTI, E. Sintaxe: explorando a estrutura da sentença. In: J. L. Fiorin (org.). Introdução à lingüística I. São Paulo: Contexto, 2002, Vol. 1: objetos teóricos.


Qualquer falante de uma língua natural tem como noção inerente, intuitiva, a competência lingüística que permite distinguir, na estrutura de uma sentença, tanto sua constituição hierárquica quanto a noção de que esta se distingue em dois momentos: uma parte contendo itens lexicais que demandam imposições restringem os elementos que atendem a essas e outra parte onde esses itens estão contidos. A noção de hierarquia vem dessa necessária relação de posição desses elementos, onde uma linearidade acarreta a perda de sentido da sentença, como em “A perdeu menino o bola”. As exigências dos itens lexicais, bem como estruturas formadas nos itens que correspondem à essas imposições, são próprias de grupos que tomamos como “categorias gramaticais”. A noção dessa categorização é natural dos falantes; pois percebem (intuitivamente) que as propriedades gramaticais - morfológicas, distribucionais e semânticas - morfológicas, distribucionais e semânticas - são especificas em cada grupo. A função do analista de linguagem é exatamente a de observar estas especificidades de cada item lexical e dividi-los em grupos. Essa divisão pode parecer lógica e já definida diante da classificação posta em livros de gramática, mas os casos prototípicos demonstrados são demasiadamente limitantes quando passamos a observar a vastidão da língua viva.

Estrutura de constituintes
A sentença das línguas naturais são formadas por sequência linear, porém, tal sequência não é aleatória. Usando duas frases de exemplo, tiradas do texto “Sintaxe: explorando a estrutura da sentença”; como:

a. O menino comprou uma bicicleta nova com a mesada.
b. A comprou uma menino nova o com bicicleta mesada.
Os constituintes complexos como o menino e comprou uma bicicleta nova com a mesada se unem para formar a sentença, que é considerado como o constituinte hierarquicamente mais elevado. Tal junção que parte de itens lexicais e os coloca em grupos maiores e hierarquicamente superiores, é conhecido como estrutura de constituintes. E o que a torna agramatical é a impossibilidade de formar uma estrutura de constituintes, como a frase b. Resumindo, sentenças das línguas naturais não são formadas por sequências lineares de itens lexicais. São formadas com base na estruturação hierárquica de seus constituintes, onde as palavras são agrupadas em sintagmas e sintagmas são unidos com sintagmas mais altos, até atingir o nível da sentença.
Evidências para a estrutura de constituintes
Para realizar certos efeitos discursivos, os variados constituintes dessa sentença podem ser colocados em posição inicial. No chamado clivagem, se desloca os constituintes da sentença. E nessa fase, constituintes da sentença não são só movidos para uma posição frontal, mas também são ‘aglomerados’ entre o verbo ser e o conectivo que. Da mesma forma que alguns constituintes podem ser movidos para o final da sentença. Outra possibilidade de deslocamento que manifesta a estrutura de constituintes de uma sentença construída com o verbo transitivo direto é a Passivizição. Os casos acima envolvem movimento de constituintes, onde eles evidenciam o fato de que a sentença é estruturada em constituintes, porque não é possível mudar partes de constituintes, nem sequências que gera um constituinte. Fragmento de sentenças é quando a evidencia de natureza distribucional é feita para a estrutura de constituintes de uma sentença. A Pronominazalização é outra evidencia sintática que comprova a estrutura de constituintes e que não é ligado a sua distribuição na sentença. As línguas naturais usam de proformas para retornar a referencia de entidades e eventos já mencionados na sentença ou no discurso. E as proformas só substituem constituintes sintáticos. A elipse é um fenômeno lingüístico que é envolvido por outro recurso que se tem para evidenciar constituintes cujo núcleo é o verbo.

Ambiguidades estruturais
Nesse caso, o que a sintaxe vai fazer é investigar a possibilidade de a ambiguidade de uma sentença como estar associada a diferentes estruturas. Quando se move constituintes diferentes, se desfaz ambiguidade da sentença, e se resume a uma forte evidencia de que tal ambiguidade é causada pela possibilidade de a sentença apresentar duas estruturas sintáticas diferentes.

Predicados e argumentos
Com base na idéia de que usamos as línguas naturais para expressão do pensamento é que se dá esta seção sobre predicados e argumentos. Para se ter uma noção desses conceitos tem-se argumentos caracterizados como elementos capazes de satisfazer as exigências de um certo predicado, desempenhando papéis específicos determinados pelo mesmo. No caso em que há apenas um argumento, denomina-se predicado de um lugar; se há dois argumentos, predicado de dois lugares e assim sucessivamente. Quando há um predicado de dois lugares, cada um dos argumentos desempenha um papel diferente. Em relação aos predicados, todas as categorias lexicais podem funcionar como tais, entretanto os verbos são considerados predicados por excelência. Verbos, nomes, preposições, adjetivos e advérbios, podem ser predicados, sendo que estes impõem exigências sobre os seus argumentos, sendo estas de caráter semântico e sintático. Quanto às exigências semânticas, caracterizam-se por estarem associadas aos papéis desempenhados pelos argumentos do predicado, chamados de papéis temáticos. De acordo com o número de argumentos do predicado, se dá o número de papéis temáticos. Por exemplo, um predicado de dois lugares apresentará dois papéis temáticos aos seus argumentos: O de agente (realizador) e o de paciente (receptor); Um predicado de três lugares pode ainda ter mais um papel temático além destes dois citados: o de Instrumento (objeto com o que se realiza uma ação). Já as exigências sintáticas são as que fornecem um esqueleto estrutural sobre o qual os itens lexicais são projetados. Na sintaxe um núcleo é o termo responsável por todas as exigências impostas aos outros termos da sentença. Um dos argumentos, que junta-se primeiramente ao núcleo é chamado de argumento interno e ocupam uma posição chamada de complemento. A junção do núcleo e seu complemento formam um sub-constituinte ao qual se junta o segundo argumento denominado argumento externo. A posição que este ultimo ocupa é chamada de especificador. Ainda na sintaxe é válido citar que certos constituintes não são previstos como exigências dos predicados no léxico, são aqueles que ocupam a posição de adjunto.

Roteiro de leitura: gerativismo

1. ItálicoO programa de pesquisa gerativista assume como um dos seus pressupostos que a linguagem é uma capacidade inata dos seres humanos. Segundo os gerativistas, quais são as evidências que sustentam esses pressupostos?

O primeiro ponto a ser tratado pelos gerativistas é o fato de todo ser humano ser falante de uma língua natural e ter um conhecimento natural sobre ela, que caracteriza uma competência inata, ou seja, este conhecimento natural é também biológico, uma herança genética, como dissemos anteriormente, o que apóia sua teoria sobre a linguagem ser inata a todos os seres humanos.
Também, é importante para a escola o fato de que toda língua possui o mesmo grau de complexidade, referindo-se ao sistema de regras ao qual obedece seu funcionamento. E esse sistema de regras, essa complexidade é dominada pelos seus falantes, independente de fatores exteriores ao sujeito falante ou ao próprio sistema.
O processo de aquisição da linguagem também é ponto crucial da teoria dos gerativistas. O princípio da criatividade estabelece que todo falante tem a capacidade de construir enunciados inéditos a partir somente do conhecimento inato sobre o funcionamento da língua. Uma criança em fase de aprendizagem de uma língua apreende o funcionamento de alguns elementos, como por exemplo a conjugação de alguns verbos aos quais ela está acostumada, e aplica esse funcionamento a outros verbos, a partir da formulação de hipóteses. É comum que a criança diga “eu di” ou “eu fazi”, pois ela está familiarizada com as conjugações “eu comi” ou “eu bebi”.

2. A linguagem humana no entendimento de Noam Chomsky baseia-se em uma propriedade elementar, chamada propriedade da infinitude discreta. Explique o que vem a ser tal propriedade.

O princípio da infinitude discreta está associado ao princípio da recursividade. Este baseia-se no pressuposto de Chomsky de que a língua possui um número finito de elementos, dos quais os falantes lançam mão para produzir um número infinito de combinações entre eles. Chomsky elimina através desse princípio o conceito de estrutura relacionado à linguagem, já que estas combinações imprevisíveis, já que infinitas, não constituem um corpus homogêneo e de fato estrutural a não ser em relação ao funcionamento de outras línguas.

Nicolle Casanova

Chomsky e a escola gerativista

Os estudos gerativistas dispensam a concepção que enxerga a aquisição da linguagem como um processo de estímulo-resposta, propondo que a apreensão de um sistema como este se dá através de um trabalho de formulação de teses e hipóteses baseado em um conhecimento prévio da língua, que obtemos através de herança genética. Considerando este aspecto, e produzindo ciência em um contexto ainda positivista, Chomsky até propõe que a linguagem seja estudada pela Biologia, tão certo estava da hipótese da linguagem estar presente no cérebro humano. Assim, nos moldes da célebre distinção saussuriana entre langue e parole, Chomsky, por sua vez, estabelece uma diferença entre competência e desempenho.
Partindo da idéia da linguagem humana ser inata, Chomsky pressupõe a existência de uma gramática universal, a despeito das especificidades inerentes a cada língua. O autor observa traços característicos comuns a todas as línguas, como o fato de todas se estruturarem com o estabelecimento de um sujeito e um predicado, ou o fato de todas distinguirem três pessoas na elaboração de sentenças e, principalmente, o fato de todas compartilharem do
princípio da recursividade.
A partir desse princípio, Chomsky elimina a possibilidade de estudar a língua em uma única estrutura, pois suas possibilidades são infinitas, quer dizer, toda língua possui um número finito de elementos lingüísticos a partir dos quais o falante constrói um número infinito de combinações.
No próximo post, um roteiro que esclarece os pontos de que tratamos aqui.
Nicolle Casanova